Primeiramente, eu gostaria de dizer que o encontro
para o livro Cavaleiro Inexistente foi fantástico! Amei nossos debates, e, para
aqueles que infelizmente não puderam ir, quero destacar alguns temas e
discussões aqui.
Primeiro, comentamos o mais óbvio: o fato de Agilulfo
Emo Bertrandino, o cavaleiro dos Guildiverni e dos Altri de Corbentraz e Sura,
não existir – ser um ideal da cavalaria. Suas características peculiares, como
a de sempre se lembrar de todos fatos, datas e detalhes ocorridos em batalhas
(o que muito irritava os companheiros paladinos); depois a declarada repulsa
dele em relação ao que era humano, no plano físico, como dormir com os dedões
apontando para o céu, a própria função de dormir a ele era desconhecida e
impossível; sua impecável conduta, propósito e zelo em servir seu rei e seu
propósito; além, é claro, do estado permanente, infinitamente imaculado e
reluzente, de sua armadura.
Não pudemos deixar de notar, no próprio texto, certa
troça quanto ao ideal virtuoso, a infalível honra e o extremo marco presente
nos contos de cavalaria. Como 'ser um cavaleiro' era a única razão para
Agilulfo existir, seu desaparecimento foi determinado ao final do livro quando
seu feito de bravura, o de defender a virgindade da donzela Sofrônia, foi
revelado nulo.
Também comentamos sobre Agilulfo ser o único desejo de
Bradamante, a destemida guerreira, justamente por ser o objeto ideal. Cansada
de todos outros, homens de carne e osso, ela ansiava pelo modelo
fantástico, nenhum outro. Na conclusão do livro, o leitor descobre que
Bradamante é, na verdade, a narradora confinada no convento,
e nesse momento ela percebe-se finalmente pronta para aceitar um homem comum,
um homem de carne e osso: Rambaldo de Rossiglione. Assim, Bradamante desiste do
cavaleiro ideal e alegremente entrega seu amor ao cavaleiro que a amava e
procurava por ela. Inclusive, de alguma forma, ela mesma aguardava-o
ansiosamente.
Outro ponto muito interessante foi aquele que
Alessandra compartilhou: um ponto de intertextualidade entre o Cavaleiro
Inexistente e Razão e Sensibilidade, de Jane Austen. Na ligação entre dois
personagens e sua mútua complementação (quase uma simbiose). A maneira como os
personagens se completam, em Razão e Sensibilidade - uma irmã totalmente razãoenquanto
a outra emoção – e em Cavaleiro Inexistente um cavaleiro que
não existe mas que é consciente de seu papel e vida, ao lado de Gurdulu que
existe (fisicamente), mas não possui consciência de sua existência e papel. ADOREI!
O grupo também riu muito – até sentir calor em excesso
e recorrer aos abanadores - nos comentários sobre as cenas de
Gurdulu e as damas da Lady Priscila; da impressionante cena noturna da própria
Lady com o cavaleiro inexistente. Apesar de não realizarem fisicamente um ato
sexual, o cavaleiro em sua honrada conduta enche-a de carinhos, cortejos,
atenção e mimos, ao que ela responde com extremo regalo. Todos os outros
cavaleiros que Lady Priscila havia atraído para seu castelo – e que depois
tornaram-se eremitas – tiveram noites em toques e atos sexuais com ela, já o
cavaleiro inexistente, diferente e incapaz disso, passa a noite inteira em
expressões, palavras de carinho e serviços que não se consumam no ato sexual,
porém na elevação da alma feminina. Com isso, ele se torna inesquecível,
profundo e diferente de todos os outros.
Agora, sobre os intérpretes: aqueles que não podiam
ser mortos nas guerras, pois senão como poderiam os soldados xingar-se,
ofender-se e lançar juras de vingança e ódio eterno? Como poderiam as mortes
por confusão e má interpretação existir?
Outra detalhe muito engraçado veio das frases da – até
então – irmã Teodora, narradoras nas páginas onde ela tenta descrever um pouco
do conhecimento das suas companheiras em relação ao amor. Como ficaria
insuficiente minha explicação humorística nesse caso, prefiro a transcrição da
obra para finalizar meus comentários sobre esse maravilhoso encontro.
“Escrevo no convento, deduzindo coisas de velhos
documentos, de conversas ouvidas no parlatório e de alguns raros testemunhos de
gente que por lá andou. Nós, freiras, temos poucas ocasiões de conversar com
soldados: e, assim, o que não sei, trato de imaginar; caso contrário, como
faria? E nem tudo da história está claro para mim. Vocês vão me desculpar:
somos moças do interior, ainda que nobres, tendo vivido sempre em retiro, em
castelos perdidos e depois em conventos; [...]
[...] Não digo que não tenha ouvido falar disso: pelo
contrário, no mosteiro, para manter-nos afastadas das tentações, às vezes se
discute a questão, da maneira que podemos fazê-lo com a vaga ideia que temos
sobre ela, e isso ocorre, sobretudo, cada vez que uma de nós,
coitadinha, por inexperiência, fica grávida ou então, raptada por algum
poderoso não temente a Deus, volta e nos conta tudo o que lhe fizeram.”
Momentos fantásticos ao lado de pessoas maravilhosas
Nenhum comentário:
Postar um comentário